Joaquim de Araújo Lima, quarto governador nomeado, exercendo o mandato até 22 de fevereiro de 1951
Veio da Bahia o primeiro governador civil do Território Federal do Guaporé. O engenheiro Joaquim de Araújo Lima (PSD) assumiu o cargo em nove de junho de 1948, indicado pelo deputado federal Aluízio Ferreira e nomeado pelo presidente cuiabano Eurico Gaspar Dutra*.
Daquele estado nordestino também se mudou para a antiga Santo Antônio do Rio Madeira o médico e jornalista Joaquim Augusto Tanajura, que 32 anos antes se elegia pelo voto direto o segundo prefeito de Porto Velho (1917-1920).
“Um homem culto, poeta e ativista”, lembra o historiador e acadêmico de letras Abnael Machado de Lima. “Ele também foi ativista político, membro chefe da Ação Integralista Brasileira (AIB)**, colocada na ilegalidade em 1938”, conta.
O integralismo foi um movimento político fascista nacionalista criado em sete de outubro de 1932 por Plínio Salgado, escritor modernista, jornalista e político, com participação discreta na Semana de Arte Moderna de 1922.
Os membros da AIB foram presos confinados no Arquipélago Fernando de Noronha, em Pernambuco, entre eles Lima, que, graças à anistia, mudava-se para Porto Velho no início da década de 1940. É de sua autoria a letra do Hino de Rondônia, com o poema Céus do Guaporé.
Quarto governador nomeado, exercendo o mandato até 22 de fevereiro de 1951, ele chegou a Rondônia no período da Marcha para o Oeste, decretada por Getúlio Vargas para sensibilizar a sociedade a apoiar a ocupação de fronteiras desabitadas do País. Foi também superintendente de Abastecimento do Vale Amazônico e diretor geral da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, em substituição ao então coronel Aluízio Ferreira.
PALÁCIO, CARMELA E ESCOLAS RURAIS
O quarto governador inaugurou, em Porto Velho, postos de saúde e escolas. Da mesma forma, esses benefícios também chegaram a Abunã, Costa Marques, Vila Ariquemes, Vila Rondônia (Ji-Paraná), Ariquemes, e Guajará-Mirim.
Araújo Lima lançou a pedra fundamental do futuro Palácio Presidente Vargas, em 13 de setembro de 1948, confiando a sua construção ao seu diretor da divisão de obras, engenheiro e arquiteto José Otino de Freitas.
“Uma edificação com linhas sóbrias, elegantes, e de característica neocolonial”, observa Abnael de Lima.
A inauguração só ocorreria em 29 de janeiro de 1954 durante as comemorações dos dez anos de instalação do território, no governo de Ênio dos Santos Pinheiro (1953-1954). Com o Palácio, inaugurava-se também o busto do então presidente Getúlio Vargas, em homenagem ao criador do Território Federal do Guaporé, fato ocorrido em 13 de setembro de 1943. O busto foi colocado num pedestal na entrada principal do primeiro lance de escadas da sede do governo.
Após a ditadura de Getúlio Vargas entre os anos de 1947 e 1948, o governo federal decidiu construir “escolas rurais”, medida que atendeu Porto Velho, com obras financiadas pelo Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep).
O sucessor de Frederico Trotta abraçou a causa da educação, destacando-se entre suas primeiras obras a recém-demolida Escola Samaritana, uma das primeiras na categoria das “rurais”, situada entre as ruas Gonçalves Dias e José Bonifácio, a trezentos metros da Brigada de Infantaria de Selva (antiga 3ª Companhia de Fronteira).
Comunidades dos rios Madeira, Ji-Paraná, Jamari, Mamoré, e ao longo do trajeto da ferrovia, até Abunã, também receberam essas escolas. “Ele acompanhava pessoalmente as obras, dialogando com a comunidade”, conta o historiador.
Já em 1950, Araújo Lima iniciou a construção do prédio da Escola Normal Carmela Dutra, outro projeto do arquiteto Otino de Freitas, que ainda projetara a sede administrativa da Madeira-Mamoré (Prédio do Relógio). Ali também funcionaram o Fórum da Comarca e a extinta sede do Banco do Estado de Rondônia (Beron) que o atual prefeito da capital, Hildon Chaves, pretende transferir seu gabinete e algumas repartições municipais.
“O Prédio do Relógio foi baseado na forma de uma locomotiva, enquanto a Escola Normal baseou-se nas formas de um navio”, explica Abnael Lima.
Nesse mesmo ano, o governador inaugurou o Cine Resky, em sessão de gala. Cabelos alinhados, sobrancelhas pretas aparadas, ele discursou no palco e ganhou aplausos antes do início da exibição de A Pecadora, estrelado pela atriz mexicana Maria Félix.
Ainda na capital, mandou construir o Porto Velho Hotel (ex-Palácio das Secretarias do Governo de Rondônia e atual sede administrativa da Universidade Federal), o Fórum Judiciário e a maternidade. Guajará Mirim ganhou os prédios do hospital e do Grupo Escolar Simon Bolívar.
A Lei nº 5.493, de 5 de setembro de 1968, concedeu pensão especial à senhora Joaquina Gomes de Araújo Lima, viúva de Araújo Lima, falecido em acidente em serviço no exercício do cargo de engenheiro da Madeira-Mamoré.
LUTA CONTRA O ANALFABETISMO,
DESDE A BAHIA
Em 1936, Araújo Lima publicava no jornal O Imparcial (Salvador) uma sequência de artigos, intitulados “Analphabetos”, “Campanha contraproducente” e “A nossa luta”.
Lima, conforme a mestranda Laís Mônica Ferreira, em seu livro Integralismo na Bahia (1933-1937), criticava duramente o analfabetismo no Brasil. Ele desenvolveu ações educacionais no núcleo provincial da AIB, o qual comandava. Trecho de um dos seus artigos:
“É uma vergonha para nós, não há dúvida, esse índice elevado ainda de patrícios analfabetos, 70% dos brasileiros desconhecem a escrita e vivem por isso retardando involuntariamente a marcha gloriosa desse gigante que Deus fez nascer na América do Sul. 30 milhões de brasileiros vivem como cegos a implorar de seus irmãos que vêm a luz bendita do saber. Miguel Couto, estrela de primeira grandeza na constelação dos grandes vultos nacionais, descreveu diante do olhar curioso dos seus admiradores a guerra sem tréguas levada a efeito na terra do Sol Nascente pelo patriotismo japonês contra o analfabetismo. E o triunfo ali não se fez demorar.
Para aquele sábio brasileiro só havia no Brasil um problema: o da alfabetização das massas. Sem a sua imediata solução, permanecerão insolúveis todas as demais questões nacionais. O nosso grande mal tem sido confiar demasiado nos meios oficiais que muitas vezes custam a mudar de atitude em face dos problemas, como queria esse outro grande brasileiro, que foi Alberto Torres. […] Se cada unidade da Federação tomasse a incumbência sincera de agir nesse campo fazendo o governo o que lhe compete e o povo também, mais cedo conquistaríamos a vitória.”
Ao apontar iniciativas da sociedade em favor da educação, entre as quais, a Liga Baiana contra o Analfabetismo, Lima elogiava o major Cosme de Farias, um de seus principais incentivadores: “(…) Há na Bahia, um louco, dessa loucura bendita de amor ao próximo. É o major Cosme de Farias. Não nos ligam os laços de campanha política nem entretemos relações. Admiro, entretanto, esse humilde batalhador das causas justas que não se sente bem quando sabe que alguém sofre. Tornou-se o patrono dos indigentes e o esteio máximo da Jornada da Luz, pugnando pela alfabetização dos seus conterrâneos.”
Jornada da Luz era como o jornal O Imparcial se referia à campanha de combate ao analfabetismo encampada pela Liga Baiana, fundada em 1915 por Cosme de Farias.
MOMENTO POLÍTICO BRASILEIRO
* Após sua deposição em 1945, o gaúcho Getúlio Vargas conseguiu eleger o general cuiabano Eurico Gaspar Dutra para a presidência brasileira pelo PSD (Partido Social Democrático). Durante o governo Dutra, Vargas manteve-se nos bastidores da política brasileira, angariando o apoio dos grupos políticos para garantir seu retorno a partir das eleições de 1950.
** Em 1932 o movimento integralista adotava algumas características dos movimentos europeus de massa da época, especificamente do fascismo italiano, mas se distanciava nazismo, porque o próprio Salgado não apoiava o racismo. No entanto, apesar do slogan “união de todas as raças e todos os povos”, o integrante Gustavo Barroso tinha opiniões antissemitas. O integralismo brasileiro era inspirado em um movimento tradicionalista em Portugal, o integralismo lusitano. Da mesma forma que outros partidos políticos, a AIB foi extinta após a instauração do Estado Novo, em 10 de novembro de 1937 por Vargas.
Fonte: Secom