O cafézinho nosso de cada dia deve ficar com sabor salgado em 2022. Fatores climáticos severos como geadas e granizo, os efeitos da pandemia sobre o consumo mundial, a crise dos contêineres, a desvalorização do real em relação ao dólar aliada ao expressivo aumento das exportações podem gerar uma alta recorde de 40% nos supermercados e a maior em 25 anos.

A análise foi feita por especialistas do Sul de Minas e economista da FGV que avaliam que o preço do produto vem crescendo em todo o mundo desde outubro de 2020, segundo dados da Organização Internacional do Café.

Ruim para o consumidor interno, nem sempre bom para o exportador. O país é o maior produtor mundial de café, com um terço de participação responde por um terço da produção mundial de café. Desde outubro do ano passado, o preço do produto vem crescendo em todo o mundo, segundo dados da Organização Internacional do Café (OIC). Somente no primeiro semestre do ano, as exportações brasileiras atingiram a marca dos US$ 136,7 bilhões, um crescimento de 35,8% na comparação com igual período em 2020.

O preço da commodity começou a amargar para o consumidor interno ainda em fevereiro deste ano, com o preço da saca no mercado físico brasileiro chegando a R$ 850. Em março, a seca registrou índices preocupantes, especialmente no Noroeste paulista, no Triângulo Mineiro e também no Sul de Minas, trazendo escassez de água nos reservatórios e perdas generalizadas das culturas agrícolas. Em outubro, o preço da saca de 60 quilos do café robusta beirava os R$ 800, enquanto o arábica, de melhor qualidade, ultrapassava os R$ 1.223. As projeções do preço da saca para maio de 2022, na Bolsa de Nova York, estão em torno de R$ 1.532. Na Bolsa de futuros de Londres, o ritmo é alucinante: R$ 2.048.

Como o café é uma cultura bienal e não tem ciclos curtos de produção – leva dois anos para que se leve uma safra a efeito –, os preços do produto devem se manter em alta por um período maior de tempo. O economista André Braz, superintendente adjunto para inflação do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV), alerta que o café está entre as culturas que foram impactadas pela estiagem. “O café está entre as vítimas da seca. Tivemos quebra de safra na cana – e a gente sabe que o café vai sempre junto com o açúcar. Como exemplo, a quebra de safra de milho jogou a carne de frango lá pra cima. A bola da vez é o café. As geadas comprometeram muito a árvore cafezal e as podas. Existem vários tipos de poda, mas estas necessárias para preservar os pés foram pesadas demais, o que diminuiu a oferta do grão. E com a queda na oferta, o preço disparou”, explica.

Seca e geadas

As geadas registradas em julho comprometeram ainda mais a safra. O arábica subiu 10% e atingiu o patamar de preço mais alto em sete anos. Líder mundial na produção e  exportação do produto – com apenas 30% da produção voltados para o mercado interno -, o Brasil vislumbrou também o aumento das exportações no momento de alta do dólar em relação à moeda brasileira.

Produtor e exportador de café especial no Sul de Minas, Thiago Trovo também se dedica à torra de grãos de alta qualidade e à originação para importadores de café nos Estados Unidos e na Europa: “Este ano, estou pagando em torno de R$ 1.500 – ou um pouco mais – pela saca de café especial. Com o preço do dólar lá em cima, diminui a preocupação com a qualidade. A margem de lucro pode parecer maior, mas os insumos, fertilizantes e defensivos para a manutenção da planta são importados e, obviamente, dolarizados. Na conta final do produtor, talvez valesse mais a pena o preço do ano passado com o dólar com cotação mais baixa do que atualmente”, sugere Trovo.

Mas, há outras pedras no meio do caminho: por exemplo, a alta da demanda por contêineres, que estão parados nos portos asiáticos e europeus. Com isso, encher o reservatório de grãos, segundo a Drewry – consultoria de pesquisa marítima -, subiu 289% em um ano, e o preço disparou para R$ 56 mil o espaço de 12 metros.

O engenheiro agrônomo Eduardo Matavelli faz auditorias para a concessão de selos de qualidade e sustentabilidade. Ele lembra que o Brasil é o único país a produzir os dois tipos de café – arábica (que corresponde a cerca de 70% da produção) e robusta (ou conilon) e chama a atenção para os fatores climáticos: “No somatório de cinco ou seis anos, o Brasil perde uma safra inteira por causa do clima. “A gente está falando de 50 milhões ou 60 milhões de sacas no período. O país tem 2 milhões de hectares de café. Nesse ano, calcula-se uma perda de 20% de área causada pela geada, totalizando 400 mil hectares. A produtividade brasileira hoje é de 25 sacas de café por hectare. Multiplicando isso, de acordo com levantamento feito por cooperativas e traders, a perda pode estar entre 5 a 10 milhões de sacas. Somente para efeito comparativo, a Colômbia produz 14 milhões a cada ano”, calcula Matavelli.

 

Fonte: Agrolink

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