Por Sérgio Pires
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De vez em quando vale a pena vasculhar a história, para se compreender como muitas vezes ela se repete, nem sempre como farsa, como dizia Karl Marx, mas como triste realidade. Quando se fala tanto em democracia (não é de hoje que ela vale só para um lado), relembrar o último grande plebiscito feito no país, em 2005, pode explicar como nuances do passado influenciam nosso presente. Qual a mais límpida demonstração de democracia do que o voto popular? Não há, certamente, nada acima disso, ao menos em eleições limpas. Um plebiscito tem o mesmo viés. Ora, quando ele é realizado, fica clara a decisão da maioria que, numa verdadeira democracia, tem o sagrado dever de ser cumprida de imediato. Mas, no Brasil, nada é o que parece.
Em 2005, portanto num plebiscito que este ano completará sua maioridade, 18 anos (em outubro) 95.375.824 brasileiros compareceram às urnas, para votar numa mudança na legislação daquele tempo, que liberava o uso de armas, com algumas restrições ou o proibia totalmente. Quem quisesse que tudo ficasse como estava, votaria não. Ao contrário, sim. Os institutos de pesquisa da época, embora acertassem que o Não seria vencedor, erraram feio nos percentuais, porque apontavam vitória apertada da manutenção da autorização para o uso de armas.
Quando a contagem terminou, foi um “vareio”, como se diz na linguagem do futebol. Mais de 59 milhões de eleitores votaram no Não, representando 68,6 por cento. O Sim ficou com apenas 33 milhões e 333 mil votos, significando 36,06 por cento. Houve ainda 1 milhão 329 mil votos em branco e 26 milhões de abstenções, 21 por cento. Como o novo texto causaria impacto sobre a indústria de armas do país e sobre a sociedade brasileira, o povo deveria concordar ou não com ele. Os brasileiros, por ampla maioria, rejeitaram a alteração na lei.
Como curiosidade, em Rondônia, houve uma das maiores vitorias proporcionais do país pelo Não. Dos 675.911 rondonienses que compareceram às urnas, cerca de 79 por cento (519.425) votaram pela manutenção da lei de uso de armas. Mas o que aconteceu, no final das contas? Foi uma gastança, uma mobilização nacional, uma total perda de tempo. Um plebiscito só para inglês ver. Passados 18 anos, a decisão da ampla maioria do povo deste país foi completamente ignorada por todos os governos que comandaram o Brasil neste período, sob silêncio vergonhoso e histórico do nosso Congresso Nacional e dos tribunais superiores, que jamais levantaram a voz para cobrar que o que a imensa maioria decidiu nas urnas.
Uma vergonha histórica, que continua manchando a verdadeira democracia do nosso país. Até porque é uma prova incontestável que a voz do povo pode se tornar apenas base para discursos efusivos, vindas de falsos defensores da verdadeira democracia que, quando no poder, impõe suas vontades. E as urnas que se danem! O plebiscito de 2005 é prova concreta disso.
Fonte: Coluna Opinião de Primeira
Autor: Sérgio Pires